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domingo, 18 de abril de 2010

Um dia no Ceasa

Com um movimento preguiçoso o limpador abre um largo trilho no pára-brisa do Mercedes 1113. Dentro da boléia o motorista dá uma leve acelerada enquanto espera sua vez de passar no portão. Atrás, uma fina garoa encobre os caminhões que aguardam desde a noite anterior. Avenida Juraci Magalhães, 4 horas da manhã,  13 graus.




Depois de dirigir por 4 horas, puxando 7 toneladas de pepinos, amendoim, chuchu, milho e tomates, Deraldino Santos, mais conhecido como Seu Déu, saiu da cidade de Jaguaquara às 6 horas da tarde e chegou a Vitória da Conquista às 10 da noite do dia de ontem. “Nem sempre dá pra chegar antes das 7 da noite, depois desse horário os portões são fechados e aí temos que dormir aqui do lado de fora, na fila”. Contou Seu Déu. Chega sua vez de entrar, recebe a guia para pagamento - 25 reais – e segue para a operação de descarga.  Dentro, abrigados sob a estrutura de zinco, carregadores posicionam seus carrinhos e aguardam o estacionar dos caminhões. Recebem de 15 a 25 centavos por volume transportado. Sentado em seu carrinho, usado para transportar sacos de batata, caixas de tomate e demais produtos, Osmar Novais, há 10 anos trabalhando com carga e descarga de caminhões no Ceasa, explica: “Em dia bom dá pra tirar 60, 70 reais, mas tem dia que é parado. Dá uma média de 500 a 800 reais por mês.” O carrinho, conta, custou-lhe 600 reais.
 
Do outro lado, no pátio onde estão parados vários caminhões, dois descarregadores expõem a carga de um Mercedes Benz truck L 1620: 750 caixas de maçãs, vindas de Vacaria, RS. Apesar de já ser 5 horas da manhã ainda está escuro. “Saí segunda feira à noite e cheguei aqui agora de manhã, quase toda semana faço essa viagem, quando não sou eu é outro colega que vem”. Disse o motoristaValcir Paludo, gaúcho de David Canabarro. Enquanto as caixas vão sendo descidas, forma-se um pequeno comércio ao lado da carroceria, alguns chegam, perguntam o preço da maçã. “25 reais, a 198”. Responde um rapaz moreno, boné branco e prancheta nas mãos. “Mande 5 pra mim”. Encomenda o cliente. “As maçãs vêm classificadas em uma escala de 60 a 198 unidades por caixa, como uma caixa tem 18 kg, quanto menor a quantidade, maiores serão as maçãs.” Informou Leandro Oliveira, mais conhecido como Léo, encarregado de controlar a descarga para um atacadista de frutas e verduras.  

Desde que foi transferida do centro para uma das modernas avenidas da cidade, em fins de junho de 2008, a Central de Abastecimento de Vitória da Conquista tem gerado polêmicas e controvérsias. Para descarregar um veículo de 1 tonelada paga-se R$ 5,00, podendo ser cobrado até noventa reais para caminhões de cinqüenta e quatro toneladas. Fiscais municipais fazem o trabalho de controle de tráfego e recolhimento de taxas. Para os carros que vêm carregar – entram vazios, ou com pouca carga – é fornecida uma ficha que dá direito ao acesso livre. O horário de funcionamento é das 5 da manhã, às 7 da noite, com exceção das terças e sextas, quando os portões são mais cedo, às 4 da manhã.

 Possuindo apenas uma entrada central e cercado por muros e tapumes de zinco, o local escolhido abrigava uma antiga empresa particular. Um metro e meio acima do solo, no centro do terreno, ergue-se uma estrutura de concreto armado, com cobertura de zinco, que abriga os boxes. O lugar é espaçoso e, por estar acima do chão, serve de plataforma para carga e descarga. Há um local reservado a restaurantes e lanchonetes. “Tá faltando banheiro pra gente tomar banho, não tem nem como a gente sair e pegar o busão porque a gente sai todo sujo, parecendo um doido”. Lamenta o carregador Antônio Marcos. Existem dois banheiros masculinos e dois femininos que, pelo desproporcional volume em relação à demanda, estão constantemente reclamando cuidados.  “O piso do Ceasa é uma buraqueira, a gente tem uma dificuldade pra passar com os carrinhos”. Queixa-se outro carregador, João Moreira Souza. Para José Barros Júnior, morador da Rua Professora Francisca Santos, lateral à Central de Abastecimento, “o lixo e as moscas são os principais problemas. Além disso, há muita falta de higiene, pois as pessoas urinam no muro que separa a minha casa do Ceasa, de forma que o cheiro fica insuportável”. “Sabemos que temos algumas dificuldades, muita coisa precisa ser melhorada, e estamos trabalhando para isso.” Reconhece o Secretário Municipal de Serviços Públicos, Miguel Felício. Já para Edmilson Santos Silva, mais conhecido como Mazinho cabeleireiro, também morador da Rua Professora Francisca Santos, “a mudança do Ceasa pra cá foi muito positiva porque aumentou o movimento e trouxe mais clientes”.

A manhã avança, com um sol que nada lembrava o frio início de dia. Onze horas. O movimento cai, de forma que se instala um clima de fim de feira. Funcionários da Central de Abastecimento instalam uma caixa de som com microfone na praça de alimentação. 11:30 da manhã. O equipamento é ligado. Florisvaldo Bittencurt,  Coordenador da Secretaria de Serviços Públicos, inicia a palestra ressaltando a necessidade da legalização dos permissionários e a obrigatoriedade da taxação de serviços públicos. Mais à frente, quando trata dos custos das taxas, explica: “a preocupação do nosso governo é com os pequenos, por isso não iremos cobrar a mesma coisa de quem movimenta 1 tonelada por semana com os que negociam caminhões. O uso do solo será cobrado em duas faixas, pra quem utiliza de 1 a 31 metros quadrados pagará 4 reais por metro, acima disso o valor será de 8 reais por metro quadrado.” “Iremos arbitrar de forma justa”. Completou Miguel Felício. O processo de licenciamento foi iniciado em 15 de junho e as guias de recolhimento para utilização do solo serão começaram a ser emitidas em julho.

“Saí de um lugar que pagava 850 reais anuais, e agora vim pra um lugar privado que vou pagar R$ 1.600 mensal, R$ 18.000 reais por ano”. Queixa-se Álcio Cláudio, presidente da  ACATACE – Associação dos Comerciantes atacadistas do Ceasa. Para Mazinho – Sérgio Pacheco– vice presidente da ACATECE - “está havendo um questionamento muito grande em relação a isso porque a gente saiu de uma área pública e teríamos que ir pra outra área pública. Fomos colocados em uma propriedade privada, e aí estão querendo tirar da gente esse custo e, infelizmente, quem paga no final é o consumidor”.

Toda mudança vem acompanhada de incertezas e medos o que leva a resistências. É consenso que a cidade, para crescer, precisava desafogar o tráfego que congestionava o centro da cidade, onde funcionava o antigo Ceasa. Notório também é a urgência de melhorias na atual estrutura. Enquanto isso o cidadão conquistense vai à quitanda, ou à feira, enche sacolas plásticas e abastece sua cozinha de frutas e verduras que passaram pelo Ceasa. 
                                                                   Conquista, junho de 2009.
                                                                   Alberto Oliveira

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